Obrigado, David Bowie
Fui pego desprevenido pelo glam rock em um momento que personalidade era a última das coisas que eu tinha definida. Acho que me interessei por Marc Bolan e David Bowie assim que entrei em contato com toda aquela androginia misturada com rock, talvez por intermédio de Brian Molko, não lembro. Eles aparentavam tanta liberdade, coragem e confiança – qualidades que eu não tinha, ainda.
Quando se é jovem, esquisito, desajustado e ainda não se encontrou no mundo, o sentimento de não pertencimento passa a ser cada vez mais aterrorizante. A não ser que você tenha David Bowie. Aos poucos, ele me ensinou que estava tudo bem ser freak, que eu precisava sair da minha bolha e deixar de ser quadrado, que eu precisava experimentar. Me experimentar. Foda-se se você é um alien e metade da pequena cidade conservadora te reprova.
Hoje eu sorrio ao lembrar das vezes que entrei em uma loja para provar roupa feminina, causando choque e desconforto nas vendedoras. “Androgiiinaaa!”, gritava algum amigo no meio da rua às vezes, rindo comigo e não de mim, na maior parte das vezes. E que tal o raio borrado na cara, uma tentativa frustrada de ser a lady insane? Eu me tornava cada vez mais forte, mas ainda não havia me dado conta.
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David Bowie é meu ídolo, meu maior ídolo. Por anos eu esperei que ele ressurgisse, demostrando um poder juvenil guardado e uma potência de tirar o fôlego em todos os aspectos que um dia me modificaram. E aconteceu, há 3 anos, meus olhos se encheram de lágrimas com o anúncio de The Next Day, e a minha espera então se tornou uma vã esperança de que o dia que eu estaria próximo a ele estava cada vez mais próximo de se realizar. E aconteceu, hoje, meus olhos se encheram de lágrimas ao saber de sua morte. Parafraseando Carl Sagan, outro gigante que eu admiro tanto, diante da vastidão do tempo e da imensidão do Universo, é um imenso prazer para mim ter dividido um planeta e uma época com David Bowie. Nunca estivemos tão próximos.
Obrigado, Blackstar, por toda as modificações que influenciou em mim e na minha construção de identidade. Aqui dentro ainda tem aquele freak de 13 anos que antes se deixava reprimir, mas já aprendeu a lição. I had my five years to sigh
(Talvez, em algum outro universo, role uma nova disputa com Marc Bolan para ver quem é melhor.
Cuidado, ele chegou bem antes de você.)