Meu ódio pelo 2fa só aumenta, assim como minha cabacice digital

às vezes acho que a autenticação de dois fatores é minha arquinimiga digital (e sou seu maior cúmplice)

Meu celular morreu. Adoraria que a única consequência fosse o benefício de não poder recarregar a dopamina do cérebro com notificações e conteúdos a serem esquecidos no instante seguinte.

Mas o que me esqueci é que, entre as tantas maravilhas tecnológicas dessa era, se encontra a tão querida autenticação de 2 fatores - aquela que, em nome da segurança digital, deixa cabaços analfabetos digitais como eu trancados do lado de fora.

Claro que não sou um analfabeto digital. Ter um blog que eu mesmo hospedo me garante algum crédito. No entanto, a autenticação de dois fatores me faz sentir assim toda vez que fico sem celular e sem rede - algo que ocorre ocasionalmente, e que, sinceramente, até queria que acontecesse mais.

Toda vez que preciso de algo importante e não tenho acesso à autenticação de dois fatores, que em algum momento configurei para proteção extra, sinto que toda a frustração e raiva que ela me faz passar não vale a segurança.


quando desconectar vira luxo

Amo quando circunstâncias fora do meu controle me deixam desconectado, offline. Adoro quando acaba a energia, comemoro. Ficar sem celular, apesar da impossibilidade de fotografar, é quase um alívio. Gosto de não ter celular, é uma desculpa fácil. Torna mais simples não acompanhar redes sociais e interagir, inclusive, com amigos.

É como quando a gente trabalha tanto que chega aquele estágio pré-burnout, sonhando em ficar doente ou ser atropelado, qualquer coisa que nos leve ao hospital e nos deixe internado. Só para não ter que fazer absolutamente nada além de ficar deitado numa maca se recuperando. Sabe? Sinto-me assim toda vez que dá ruim com meu celular. Como se eu tivesse sido atropelado e levado ao hospital, onde não preciso fazer nada, pois não tenho mais celular. O mundo não é mais igual, eu não faço mais parte dele.

Em 2017, fiquei pelo menos seis meses sem. Na época, eram muitas as reações desacreditadas. A parte mais difícil era com transporte por aplicativo, mas eu dava um jeito: pedia para alguém chamar o carro e pagava depois. Mas isso tem quase 10 anos, agora parece que ficou mais complicado.

Para viver sem celular agora, eu precisaria de uma renda estável, como tinha naquela época. E, claro, sem o 2FA ativado. Também torcer para que os serviços não exigissem essa autenticação, como o Banco Inter, que já me fez tomar no cu nesses poucos dias em que estou sem celular, afinal, nenhuma merda vem sozinha.


quando o 2fa faz da vida um inferno

“tec” no chão

Num lindo momento de pôr do sol, pensei: vou ler um livro lá fora, sair desse quarto. Estava usando uma bermuda muito fina e larga. Quando fui sentar no chão, só ouvi o "tec" do celular batendo - ele chegou antes da minha bunda. Será que quebrei a tela? Peguei e não estava funcionando, embora a tela intacta. Não sei se foi da batida ou se já estava destinado a morrer - possível, troquei a bateria duas vezes nos últimos três meses e sabia que alguns componentes estavam levemente oxidados.

Segunda-feira foi O CÃO. Tinha que pagar a conta do domínio “jesus.com.vc”. Estava enrolando há tempos e chegou a data limite. Ah, foda-se, vou perder esse domínio, não uso há anos mesmo. Cogitei, mas mudei de ideia (porque amo esse domínio!!!). Mas como pagar uma conta se o banco estava no celular que morreu?

Alguém tem que avisar os atendente do banco inter PRA RESPONDER DIREITO AS COISA

Aí, começou a saga com o suporte do Banco Inter. Os caras falam igual robô, parei duas vezes para perguntar: “você é humano?”. “Sou sim”. “Então, por que tá falando assim? Por favooorr, fala comigo que nem gente”.

Eu fazia uma pergunta, tipo "como acesso o banco inter sem celular e sem rede?" e o cara me mandava exatamente pra tela de QR code! Acho que era algum ctrl+c e ctrl+v. Mas que caralho. 40 minutos no chat do Banco Inter para confirmar que não é possível acessar o internet banking sem celular.

Poderiam ter me respondido logo na primeira pergunta: “Sinto muito, mas não é possível :/“ ou “é óbvio que não otário, em que mundo tu vive?”. Ou até mesmo só um “Não”, direto e reto. Pronto, informação passada. Mas não, pra que facilitar né? Precisou de 40 minutos pra chegar a essa resposta. Aposto que o atendente descobriu junto comigo.

Parti pra gambiarra. Instalei o banco num tablet, consegui remover o token do meu celular através dele, depois de fazer umas fotinhas confirmando minha identidade. Só não pude acessar o banco em si, pois era preciso, TANANAÃA: um código SMS, a arrombada da autenticação de 2 fatores.

Eu tô no meio da roça, zona rural de uma cidade de 14 mil habitantes. Não tem sinal de rede! AQUI NÃO EXISTE A POSSIBILIDADE DE RECEBER UM CÓDIGO SMS SEUS FILHO DA PUTA. :@

Troquei o número de celular cadastrado pelo número da minha mãe. Peguei o celular dela e saí andando pela estrada de terra em busca de sinal. Duas vezes consegui o código e voltei correndo, mas não a tempo suficiente para aceitarem. Na terceira vez, levei o tablet comigo e coloquei o celular para rotear a internet móvel. Mas receber o código SMS não significa ter acesso à internet.

Lá fui eu, otário, andar atrás de uma conexão. Andei, andei e me afastei de casa. Nada da internet. Bom, já que eu já tinha andado tanto, continuei.

Se algum contatinho passasse de carro por mim naquele momento, certeza que nunca mais rolaria uns beijo. Eu todo mal trapilho, cabelo desgrenhado. Não é como se esperasse ver alguém, vestido do mesmo jeito que acordei e procurando sinal para receber um código SMS na roça de última hora…

Andei, andei, andei. Somente quando estava chegando na rua asfaltada, a internet começou a funcionar. Quase três quilômetros de distância de onde estava inicialmente, carregando aquele tablet e celular debaixo do Sol. A palavra trouxa tem cara, e é a minha.

Ok. Merda resolvida. Banco no tablet e funcionando. Conta paga. Já imaginando que não demoraria pra surgir um novo empecilho na vida de quem não tem celular. E logo veio…

One Drive devolve meus gigaaa

Precisei usar o outlook. O OUTLOOK. Não lembro a última vez que abri meu email do outlook, mas precisava para acessar um arquivo importante no OneDrive.

Se tivesse precisado desse arquivo a qualquer momento do ano passado, teria me salvado de uma grande merda, pois de repente me veio à tona que, por não ter pago a assinatura, meus arquivos provavelmente foram removidos da nuvem. E nem era backup hehe.

Meu computador anterior não tinha espaço e, por um tempo, fui obrigado a salvar arquivos importantes no OneDrive, que funcionava por causa desses vales-presente de um ano promocional. Você já pode imaginar que tomei no cu grandão.

Levemente desesperado para saber se a Microsoft já havia apagado meus arquivos, tentei acessar o OneDrive com o login do Outlook. Sem sucesso, pois adivinha? AUTENTICAÇÃO DE DOIS FATORES.

Era necessário confirmar via Microsoft Authenticator. Provavelmente comecei a usá-lo após problemas com o Google Authenticator. Veja bem, tenho um histórico complicado com autenticação de dois fatores.

Levanta a mão quem tá trancado pra fora do Facebook por causa do 2fa o/

Estou trancado pra fora do Facebook há anos porque vacilei com o Google Authenticator. Acontece que o Google Authenticator não tinha sincronização na nuvem até pouco tempo atrás (sabe, a gente tá falando do google e os cara não tinha sincronização na nuveeeeem). Assim que meu celular na época morreu, não pude mais acessá-lo e, consequentemente, nem ao Facebook.

Passei a usar o code generator, mas assim que o Facebook o desativou, já era. Perdi o acesso ao Facebook (como já contei no Órbita), e muitas outras pessoas passaram pelo mesmo. O que me faz confirmar: sim, sou um burro imbecil digital, mas não estou sozinho. Somos muitos.

Sem Google, sem Microsoft… Um completo cabaço digital

Enfim, o Microsoft Authenticator tornou-se meu aplicativo de autenticação. Instalei ele no tablet para conseguir acessar a conta do OneDrive. Mas adivinha? É PRECISO AUTENTICAÇÃO DE DOIS FATORES PARA ACESSÁ-LO. Sério, me matem.

Se eu tento forçar um acesso tradicional ao outlook (apenas colocar a senha), dá erro de “Too Many Requests” ou que preciso tentar outro dispositivo (?). Ok, vamos tentar outras possibilidades. Tentei seguir usando o login de recuperação; coloquei o e-mail de backup. E adivinha? Ele pede a autenticação de dois fatores, ELE PEDE A PORRA DE UM SMS. AAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAA.

OK. Calma. As pessoas por trás da autenticação de dois fatores pensaram em alternativas, certo? É pra isso que existem os recovery code. Certo? CERTO!

Tá. Qual é meu recovery code?

Uma pessoa sensata poderia imaginar que depois de tantos anos brigando com o 2fa, eu teria meus códigos de recuperação salvos em algum lugar.

Né? NÉÉÉ?? EU TAMBÉM. Mas quem disse que eu encontro os bonitos?

Como um data junkie como eu, aficionado por anotações e gestão de conhecimento, não consegue encontrar a porra de códigos de recuperação de uma conta??

EU NÃO SEI. O 2fa faz eu me sentir um cabaço digital!

Minha mãe tem um caderno de senhas e frequentemente tem dificuldades para acessar suas contas porque são inúmeros logins e senhas alterados umas sobre as outras. Ocasionalmente, a senha anotada não funciona e ela precisa da minha ajuda. Fico imaginando se ela colocasse o 2fa nessas contas.

Eu me sinto como a minha mãe em relação à galera que é uma tartaruga. O 2fa é um risco para mim mesmo porque sou o meu pior inimigo.

Resolvi conferir os recovery codes das contas Google e já deixar salvo no Bitwarden. Elas já estavam lá. Claro que estariam. Não estou vivendo uma situação emergencial trancado pra fora da conta Google no momento, quando isso acontecer, aposto que vão desaparecer esses benditos.

Aliás, acessei o OneDrive pelo tablet, já estava logado. Ele indica que estou usando < 0.1 gb dos meus 5gb gratuitos. Ou seja, mais de 700gb de informação foram excluídos. DAHORAÇA. 🫠


Reflexões sobre meu uso de tecnologia e organização digital

Viver desconectado é luxo. E essa desconexão desejada esbarra numa realidade de merda: serviços essenciais estão amarrados a sistemas que não perdoam falhas humanas e nem limitações tecnológicas.

Segurança digital é uma burocracia sufocante. Quanto mais tentamos proteger nossos dados, mais ficamos presos à complexidade de gerenciar múltiplos códigos, apps, backups e senhas. Isso cansa.

Preciso repensar um sistema de segurança e controle de arquivos que funcionem para mim atualmente. Minha relação com a tecnologia está disfuncional.

Por mais que possa parecer contraditório expressar isso AQUI, num blog, meio que sinto asco de boa parte do que se tornou a tecnologia e acabo ignorando tarefas digitais “básicas” (?) que parecem exigir mais do que posso entregar.

Se fossem outros tempos, estaria chorando em posição fetal por perder os 700 GB do OneDrive. Quero acreditar que a maioria fossem fotografias que estão no Google Photos. (Meu deus preciso fazer backup de lá, e pra onde?!)

Sei que parte dessa desorganização é por eu ter virado meio eremita no passado. Estava muito mais interessado em explorar minha espiritualidade do que me preocupar com serviços e arquivos online.

Ainda que não esteja mais nessa fase, meu estilo de vida e minha relação com dinheiro continuam entrando em conflito com as questões que exigem estabilidade. Talvez nunca se conciliem.

(Escrevi e apaguei vários parágrafos sobre isso - sobre como organizar backups e manter assinaturas online tem um custo que pesa no meu estilo de vida e o quanto é frustrante ver minhas diferentes perspectivas de enxergar a vida se chocando e causando estragos. Continuam sendo pensamentos bagunçados, sem conclusão alguma.)

Provavelmente, estou exagerando. Ah, sei que tô. Mais fácil lascar um foda-se e eu mesmo deletar tudo que tenho HAHA Nada disso importa mesmo. (Mentira! Eu me importo demais com minhas fotografias e textos)

Quanto ao 2fa, MORRAAAA. EU TE ODEIO AUTENTICAÇÃO DE DOIS FATOREESSS.


File over app

Esse rolê reforçou ainda mais a necessidade de uma filosofia “file over app”. Se um dia eu voltar a ser meio eremita, e tão puto com a tecnologia que eu negue ter contato com qualquer eletrônico por um tempo, quem me garante que o Roam Research ainda estará lá com as minhas anotações quando eu voltar? Ainda que tenha backups em .json e .edn, não é a mesma coisa - eu nem saberia converter as informações por conta própria.

Talvez eu devesse me forçar a migrar para o Obsidian, mesmo que eu não goste, porque a probabilidade das minhas anotações continuarem disponíveis no longo prazo é muito maior.

Também deixou ainda mais evidente como ter um segundo cérebro pode ser prejudicial se o usar como armazenamento e não processamento. A gestão de conhecimento precisa facilitar conexões e geração de novas ideias. Meus estudos precisam refletir na minha memória e não ser uma garantia de que encontrarei a informação que preciso numa ferramenta.

Gif do Logo do Cosmoliko, o planeta saturno, rabiscado